segunda-feira, 27 de junho de 2016

Hormônios bioidênticos e terapia hormonal antienvelhecimento

Em primeiro lugar, é importante ressaltar que não há novidade alguma no uso dos hormônios, assim chamados, “bioidênticos”.A endocrinologia já utiliza, há várias décadas,  para a reposição hormonal a pacientes com deficiência comprovada dos mesmos. Esses hormônios (bioidênticos) são utilizados  para a reposição hormonal em indivíduos com doenças que causam deficiência hormonal. Dessa forma, os hormônios da tireoide, do  crescimento, o estradiol (hormônio feminino), a testosterona (hormônio masculino) são todos sintéticos semelhantes ou muito parecidos ou igual aos produzidos pelos indivíduo. Pequenas modificações realizadas pela indústria farmacêutica em algumas moléculas visam permitir efeito mais prolongado e posologia mais adequada. Portanto, estes hormônios são os mesmos utilizados pelos médicos que divulgam utilizar os tais “bioidênticos”.
 Precisamos refletir em três situações muito diferentes:
  1. Reposição hormonal em pacientes com doenças que causam redução da produção  fisiológica (em quantidade normal) dos hormônios.
- Nesta situação, o hipotireoidismo, desencadeado pela redução da função da tireoide por doença nesta glândula ou após cirurgia, é o quadro mais comum.
- Temos ainda outras situações não tão conhecidas como a perda da função da hipófise, quando vários hormônios podem ter a produção prejudicada como a deficiência do hormônio do crescimento, a falta de estímulo para as gônadas causando redução da produção de testosterona, nos homens, e do estradiol, nas mulheres, prejuízo na produção do cortisol (um corticóide natural que todos produzimos), falta da produção de hormônios que controlam a água corporal, além da redução também da função da tireoide, que também depende da hipófise.
- Disfunção dos ovários quando ocorre menopausa antes da idade esperada ou quando a retirada dos ovários por doença acontece em mulheres jovens.
- Disfunção testicular decorrente de infecções, cirurgia, rádio ou quimioterapia com consequente redução da produção de testosterona.
- Redução da produção do cortisol pela adrenal suprarrenal, também doença rara.
Nestas situações, além do diagnóstico e tratamento da doença que causou a perda da função da glândula, sempre que não houver contraindicação possível, os endocrinologistas prescrevem medicamentos para repor a quantidade fisiológica (mais próxima possível do normal) de hormônios, ou idênticos aos naturais, sempre que possível, ou com efeito o mais parecido possível com a produção normal esperada para a glândula doente.
  1. Reposição em situações em que ocorre perda esperada da função da glândula, com algum prejuízo à saúde, em que a reposição mostrou benefícios. Esta demonstração de benefícios deve ser sempre feita dentro da pesquisa ética com evidência científica divulgada em publicações médicas reconhecidas em ambiente acadêmico.
.     - Nesta situação, o exemplo típico é a reposição hormonal após a menopausa. A situação normal de perda da produção do estrogênio na mulher pode ter consequências deletérias como por exemplo a osteoporose.  Os benefícios da reposição neste aspecto estão bem demonstrados. Mesmo assim, a reposição apresenta riscos que devem ser sempre avaliados e contrabalanceados aos benefícios com discussão destes entre o médico prescritor e a paciente, já que nem toda mulher irá se beneficiar desta reposição e o risco não é igual para todas. Nestes casos, a reposição pode utilizar hormônio sintético idêntico ao estradiol normalmente produzido pelo ovário em dose suficiente para os benefícios que são geralmente inferiores às produzidas normalmente pelo ovário da mulher jovem.
- Outro exemplo poderia ser a reposição de testosterona em homens idosos em que se demonstre por dosagens hormonais a redução deste hormônio por disfunção do testículo,  um tipo de menopausa masculina. Nestes casos, após dosagem hormonal que confirme a deficiência, a reposição poderia ser indicada após cuidadosa avaliação da próstata e sempre ponderando os riscos e benefícios desta reposição.
- A idade e o envelhecimento também acarretam redução na produção do hormônio de crescimento. O papel desta situação fisiológica (normal) ainda não é bem explicado mas poderia ser uma forma de proteger o organismo do desenvolvimento e do crescimento de células tumorais, por exemplo. Por isso, é preciso muito cuidado na prescrição de hormônio de crescimento para idosos normais porque, embora alguns estudos tenham demonstrado benefício na reposição deste hormônio associado à testosterona em homens idosos, esta avaliação foi feita apenas em curto prazo  e não são conhecidos os riscos da reposição por períodos mais prolongados.
  1. A terceira, e mais crítica situação, é a reposição de hormônios em doses acima das  fisiológicas (normais) em indivíduos normais e com níveis hormonais adequados normais ou mesmo até desconhecidos (por falta de avaliação apropriada) com a promessa de retardar o envelhecimento, melhorar performance sexual ou física.
- Nesta situação, estão incluídos alguns  jovens que desejam aumentar massa muscular e acreditam na promessa do "tratamento hormonal".
- Atletas com o objetivo de superar limites.
- Homens que desejam aumentar a performance sexual sem avaliação apropriada do status hormonal.
- Mulheres que desejam aumentar massa muscular ou reduzir percentual de gordura.
- Homens ou mulheres atrás da fonte da juventude.
Nestes casos, se utilizada a dose fisiológica (normal) dos hormônios, nenhuma diferença ocorre já que existe um mecanismo de controle que suprime a produção normal da glândula quando o indivíduo está utilizando hormônio externo. Por este motivo os hormônios prescritos nestas situações, além de não indicados pela falta de evidências de benefícios que superem os riscos, estão sendo utilizados em doses muito acima da fisiológica.
Isto, embora inicialmente possa causar resultados positivos, que estimulem o indivíduo a manter seu uso, geralmente tem consequências desastrosas. A utilização de hormônios sem indicação pode, dependendo da dose e do tempo, causar disfunção na glândula que normalmente é responsável pela sua produção. Por exemplo, homens normais utilizando a testosterona podem  apresentar infertilidade.
Além disto, a prescrição de doses acima das normais pode acarretar consequências muito sérias como “androgenização” de mulheres utilizando hormônios masculinos (aumento de pelos, acne, queda de cabelo); aumento de peso por uso de anabolizantes ou corticóides; diabetes, edema e dor articular por uso de hormônio de crescimento, apenas para exemplificar riscos do uso de hormônios ainda que “bioidênticos”.
Dra. Nina Musolino - presidente da SBEM-SP
Dr. Evandro de Souza Portes - vice-presidente da SBEM-SP

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